segunda-feira, 30 de julho de 2007

sexta-feira, 27 de julho de 2007

Caros amigos gostaria estar com vcs no gruta

Mais a monocultura que trabalho me escraviza

Depois eu entrarei em contato através do blog com vcs

Um abraço

e h por Alessandra Queiroz

não existe verdade...
existe a vida corrida
atrelada a estórias

eterna briga do "ser ou não ser"
do querer e não querer

procurar e não encontrar

amar para amar

amar para sentir
o

cheiro

o gozo

o sorriso

o resfriado mal curado

as feridas totalmente cicatrizadas
que já não são mais feridas
são agora histórias

caminhar em noites ....

dias...










intermináveis...

Rápidos.

Cruéis!
E muitas vezes...

lutar contra a verdade eternizada pela sacro-santa-familia

lutar por algo decente para ter, fazer

simples assim é para sentir o gosto do gozo da vida
e
da vida só levamos nossas histórias
mesmo
que
sejam
estórias...

terça-feira, 24 de julho de 2007

Sobre o zine

Por enquanto estou com o Paulo. Mas acho melhor conversar depois.
Será que dá pra alguém levar os textos na sexta?
E depois a gente conversa sobre o formato.
Acho que deveríamos montar um grupo por e-mail...
Abraços!

SOBRE O ZINE:

Postagem aberta para discussão sobre o zine.

Comentemo-nos então.

Vou deixar aqui o meu top 20. incluíndo maio / junho e julho - precisamos definir se julho entra agora ou deixamos para uma próxima edição, na dúvida, incluí julho também:

Em Branco e Cinza - Rafael
Confissões Ferroviárias - Mhel
Le Nom de La Mort - Mhel
Castro Mirabolante - Adestrador
Saliva disco 1 - Adestrador
Saliva disco 2 - Adestrador
Corisco Febril... - Nelson
A Música, outro ritmo - Alessandro
Trafego e Revolta - Mhel
Pogo - Adestrador
Um sem Alma - Rafael
A Minha Música - Alessandro
Amplidão - Alessandro
Dois Textos Velhos, o sanguinolento - Rafael
Dois Textos Velhos 2 - Rafael
A Necropsia de Todas as Alices - Adestrador
Idiótes - Rafael
À Espera de Capitú - Nelson
Média Piada - Rafael
Novos Lábios que me Tragam - Mhel

(postem por aqui mesmo, se preferirem - embaixo)

domingo, 22 de julho de 2007

O APAXONADO POR ESTANTES COM LIVRO E OUTRAS GARRAFASO APAXONADO POR ESTANTES COM LIVRO E OUTRAS GARRAFASO APAXONADO POR ESTANTES COM LIVRO E OUTRAS GARRAFASO APAXONADO POR ESTANTES COM LIVRO E OUTRAS GARRAFASOO APAXONADO POR ESTANTES COM LIVRO E OUTRAS GARRAFAS APAXONADO POR ESTANTES COM LIVRO E OUTRAS GARRAFASO APAXONADO POR ESTANTES COM LIVRO E OUTRAS GARRAFASOO APAXONADO POR ESTANTES COM LIVRO E OUTRAS GARRAFAS APAXONADO POR ESTANTES COM LIVRO E OUTRAS GARRAFASO APAXONADO POR ESTANTES COM LIVRO E OUTRAS GARRAFASO APAXONADO POR ESTANTES COM LIVRO E OUTRAS GARRAFASOO APAXONADO POR ESTANTES COM LIVRO E OUTRAS GARRAFAS APAXONADO POR ESTANTES COM LIVRO E OUTRAS GARRAFASO APAXONADO POR ESTANTES COM LIVRO E OUTRAS GARRAFASO APAXONADO POR ESTANTES COM LIVRO E OUTRAS GARRAFASO APAXONADO POR ESTANTES COM LIVRO E OUTRAS GARRAFAS

O APAXONADO POR ESTANTES COM LIVRO E OUTRAS GARRAFAS



O APAXONADO POR ESTANTES COM LIVRO E OUTRAS GARRAFAS

Natureza concreta

Bauhaus linha incorreta

Sucata estética

Dor massa

Tipografia arrasta

Lama gente

sábado, 21 de julho de 2007

Novos lábios que me tragam ( ou A garota cujo ventre fumava)

Quando as drogas foram liberadas e a propaganda de cigarros voltou a ser permitida e livre de qualquer censura, o hábito de fumar ganhou um forte incentivo do governo.
Havia uma garota que não fumava, mas sempre trazia algum cigarro entre os dedos na escola para não despertar suspeitas. Qualquer jovem que contrariasse as modas ditadas pela mídia era visto como subversivo e mantinha-se sob constante vigília policial. Estava no páteo da escola enquanto aguardava o início da primeira aula. Vestia uma saia cinza e não usava blusa. Os seios à mostra era moda nos colégios, o naturismo era quase um dever social. Num determinado momento, essa garota teve uma percepção de seu corpo até então ignorada: seu sexo respirava. Colocou a palma da mão entre as pernas e sentiu um sopro que vinha da própria vagina. Gostou daquela sensação. Seu sexo inspirando e expirando num ritmo totalmente independente do seu pulmão como se fosse outro ser era uma novidade.
Um outro ser poderia ter outros gostos, poderia ter sua própria intimidade, melhor, poderia 'ter intimidade'. A intimidade era algo combatido pela mídia. Entedia-se intimidade como pudor, e o pudor estava proibido desde que a garota nasceu.
- Se meu ventre tivesse seus próprios gostos, talvez gostasse de cigarros? – numa atitude instintiva, garota levantou a saia, abriu as pernas e pôs o cigarro em seus grandes lábios, oferecendo um dos maiores prazeres atuais àquela que, de repente, tornara-se um ser alheio ao resto do corpo.
Para a surpresa da garota e de todos que estavam em volta. Seu sexo gostava de cigarros. Tragou como se fosse uma boca viciada e soltou a fumaça, não sem antes, provocar um prazer intraduzível à garota e a todos que contemplavam à cena. Todas as aulas de sexo bizarro ou masturbação que aprendeu no primário não previam aquela forma de prazer. Era uma descoberta sua. Sentia-se orgulhosa por isso.
Mas não havia novidade que pudesse manter-se em sigilo. Em poucos minutos, os professores foram avisados da nova experiência e a garota foi imediatamente levada para o anfiteatro da escola para que demonstrasse sua performance. Mas quando a tímida garota se viu rodeada de homens e mulheres com câmeras e celulares ligados na espera de algo que até então era particularmente seu, ficou envergonhada e não quis levantar a saia.
Essa reação foi vista pelos diretores como um ato de "Reivindicação de Propriedade Corporal". A garota foi presa por pudor e moralidade excessiva.
A garota, cujo ventre fumava, firme em sua opção de não expor teu sexo à mídia nem promover a indústria do tabaco. Foi torturada e estuprada, descobriu-se grávida e doente. Sem forças para lutar, acabou enfim, por ceder o direito de transmitirem em rede nacional aquela descoberta que lhe provocou tanta dor.
Passaram-se meses e centenas de maços foram consumidos pelo seu ventre sob os olhares curiosos dos telespectadores. Seu corpo franzino e já castigado não suportou o parto e pereceu.
Seu ventre foi retirado para pesquisas científicas, e sua aptidão para tragar cigarros continuou uma incógnita. A criança ainda viveu por alguns dias. Foi batizado de Carlton. Carlton, uma linda e cinza criança, cujo ânus tossia.

sexta-feira, 20 de julho de 2007

retrato de um mundo estranho


Na falta de uma câmera fotográfica e de algo melhor pra fazer:

Estou sentado na última mesa, no fundo do bar. Ao meu lado direito as escadas que levam ao subsolo: cozinha, banheiros e mais outras mesas que a estas horas ainda não estão ocupadas. Ocupar-se-ão mais tarde, provavelmente com o movimento de esponjas adolescentes e barulhentas. Do meu lado esquerdo, uma mesa vazia e parede. As outras mesas todas acompanham o toque dessa parede. O corredor, por onde os garçons correm a noite inteira, fica entre as mesas e o balcão com bancos altos e fixos. Um apoio para os pés a um palmo do chão. Os três primeiros bancos, daqui pra lá, estão vazios, no quarto, um senhor, quarenta e poucos, sozinho, bebe sua cerveja e ri com as imagens da televisão muda que está acima da minha cabeça. Lembro ter vivido situações desse tipo, talvez até no mesmo banco. Do lado de lá do balcão, o Chapa assa carne assada e frita batatas-fritas sem reclamar. Coxinha e pizza quase verde também estão no seu arsenal. Nos quinto e sexto bancos um casal faz sua refeição sem atropelos, quase invisíveis ao lugar. Nos outros dois bancos que posso ver daqui, sentam duas garotas bonitas e altas, com uma garrafa de cerveja para acompanhar. Uma delas sai ao banheiro e a outra fica a sonhar com quais tipos de surpresa esta noite pode trazer. Os garçons são como sentinelas, andando de cá pra lá e atentos a assovios e arruaceiros. Por parte das mesas, a primeira à minha frente carrega três garotas e uma garrafa de cerveja. O ar carrega a fumaça dos cigarros delas cá pro meu lado. Hoje é sexta-feira e o meu isqueiro quase não acende o cigarro. Vez em quando uma delas lança um olhar de soslaio na minha direção. Na mesa seguinte, amparada pelo ar fresco de uma porta corrediça de vidro aberta que ocupa o lugar da parede, chega mais gente. Agora são quatro garotas e um garoto. Garrafas de cerveja, como em todas as outras, fato que pouparei das descrições daqui adiante. As garotas se beijam na boca. Independentemente do porquê o fazem, o fato é que nesses dias está em vigor a busca por certo status através desse tipo de atitude. Outras palavras: está em moda. Demonstrações cada vez mais banais, não chocam tanto quanto noutros dias. Apenas os mais moralistas teriam algum sobressalto ao perceber, mas estes ficam em casa, não correm perigo. Noutra mesa atrás, por mais que eu estique o pescoço, não vejo além de mais outra garota, de costas, de verde, com o cigarro fumando a mão esquerda. Percebo agora um rapaz também, também de verde, que acabara de buscar um maço de cigarros no balcão. Os garçons continuam e agora servem um casal que se sentou à mesa que estava vazia ao meu lado. Na derradeira mesa, logo na entrada do bar, dois rapazes e três garotas. Apenas conversam pelo visto aqui de longe. No outro segmento do lugar, que não enxergo, aposto que estão algumas pessoas em pé, comendo algum salgado da estufa ou tomando alguma pinga. Aposto que no meio disso tudo, o garçom do caixa está cobrando por todo e qualquer consumo que aconteça por aqui. Do lado de fora passa gente na calçada, sempre indo pra algum lugar. Os automóveis, na rua, a mesma coisa. Não há desculpas ou argumentos que os faça parar. Aposto que a lua também passa, indo pra algum lugar e a mesma coisa toda de parar. O barulho não cessa, é sexta-feira, já disse. Pessoas entram a todo o momento, desistem e voltam. Perderam os dois últimos lugares vazios que estavam aqui ao lado. Não há desculpa que os faça parar. Descem preocupados que já está ficando tarde e têm medo de não encontrar nenhum lugar pra sentar em lugar nenhum. Revisando: o senhor de quarenta e tantos continua sorrindo para a televisão muda, o casal continua invisível, as garotas da primeira mesa continuam fumando e os olhares continuam, e os outros todos a mesma coisa toda. Em outro lugar, aposto que pessoas perguntam sobre mim, num compromisso que fugi. Procuro qualquer desculpa pra continuar... estou já na segunda cerveja, terei de me retratar mais tarde, é quase domingo. Depois que o governo racionou todo o tipo de consumo, esse tipo de obrigação me enche a cabeça. Bela idéia essa guerra sem sangue que inventaram. Cada país apenas negando o fornecimento de seus principais produtos aos inimigos. Uns morrem de fome, outros morrem por falta de petróleo. Nós aqui já cansamos de encher a barriga de pão, carne e cerveja. Eu bebo um pouco acima da média, toda quinzena tenho de me retratar por isso. Pago a multa em carne e pão. Eu como um pouco abaixo da média. Por sorte não tive filhos antes da esterilização sorteada. Seriam um fardo pesado demais nestes dias. O barulho continua crescendo. Dizem que é reflexo da depressão. Dizem, os cientistas, que perdemos os laços com qualquer tipo de revolta ou indignação, por isso fazemos tanto barulho. Defesa natural que impossibilita qualquer mínimo indício de pensamentos. Um pouco acima da média, eu tolero o barulho. Mas não sei se é pensamento essa coisa toda. Lembro de ter lido alguns livros, mas estavam sempre em catálogos e era bom que eu lesse, diziam. Não sei se essa coisa toda é confiável. O casal saiu da mesa ao lado.

A LISTA TELEFÔNICA

Aconteceu em janeiro, primeiro foi o carteiro que trouxe a lista nova e levou a antiga, assinei o recibo e voltei para os meus afazeres, era terça-feira quente, ensolarada. Preparava uns ovos mexidos antes de sair para o trabalho, olhei para o relógio, tinha tempo de sobra, subi a escada com a lista telefônica e deixei-a em cima do criado-mudo, do lado do despertador. Preparei o café e cerca de vinte minutos mais tarde já estava no ponto à espera do ônibus para o trabalho. Tudo correu normal naquele dia, como era janeiro, a repartição ficara praticamente vazia a manhã toda. Voltei para casa mais cedo e assim que entrei no quarto notei que a lista estava caída ao lado da cama, coloquei-a novamente no criado-mudo, do lado de despertador e desci para a cozinha. Assisti umas porcarias na tv e fiquei de bobeira o resto do dia, já passava das dez da noite quando fui para o quarto, coloquei o despertador para tocar às sete e quinze do dia seguinte.
Preparava-me para deitar quando olhando para o lado novamente percebi que a lista não estava mais onde eu havia deixado, olhei para o chão e nada, procurei embaixo da cama e já começava a achar que estivesse ficando louco. Talvez tenha sido excesso de programas de televisão ou então aqueles ovos mexidos. Pensei. Fui para o banheiro lavar o rosto e quando me dei conta, lá estava ela, perto da escada, quase descendo em direção à sala. Quem sabe eu não a derrubara por acaso, era provável que já tivesse esquecido. Tudo passava pela minha cabeça, evitava a idéia da loucura e principalmente, a idéia de que aquela lista poderia ter uma vida própria. Coloquei-a novamente no criado-mudo, só que dessa vez tive o cuidado de deixar o despertador em cima, se ela acaso se mexesse ou caísse, por certo o barulho me avisaria. Na manhã seguinte o despertador não tocou, resultado, acordei às nove, atrasadíssimo, voei para o banheiro, depois voltei para o quarto, desci correndo as escadas, a tolerância de atraso na repartição era de 1 hora, portanto eu tinha 30 minutos para chegar ao trabalho, praticamente do outro lado da cidade, quando cruzei a sala, carregando a mala em uma mão e o terno na outra deparei-me com a lista telefônica, ali, sentada no sofá, a televisão ligada, um cheiro doce vinha da cozinha, corri até lá, a mesa estava feita para o café, farta com bolachas doces e salgadas, variados tipos de queijo, pão, manteiga, geléia de morango, patê de frango, ovos mexidos, torta de batata, na porta da geladeira, a conta do supermercado, tava tudo no meu nome. Depositei a mala em uma das cadeiras e fartei-me de todas aquelas coisas já não me importando com as horas. Naquele dia não fui ao trabalho, passei a tarde inteira com a lista telefônica, assistimos filmes repetidos, ela gostava daqueles enlatados americanos, dizia serem engraçados de tão óbvios, dávamos risadas, comprei duas garrafas de vinho, ouvi suas estórias, contei as minhas, de noite jantamos a luz de velas, dormimos como dormem dois anjos, a lista telefônica enfim cativara-me por completo. Os dias seguintes foram os mais ensolarados do ano e os mais felizes da minha vida, eu e a lista íamos para tudo quanto é canto da cidade, ela gostava de fazer compras, passávamos horas remexendo as prateleiras dos frios, salgados, vinhos, passei a chamar-la de Brenda. Brenda, meu amorzinho, meu anjinho, minha menininha. Ela ria timidamente e me chamava de Paul. Paul, meu anjo. Ela dizia. Quer outra cerveja? É claro que eu queria. E lá ia ela até o mercado buscar quantas cervejas eu quisesse. Tudo ia bem entre a gente, até aquela maldita tarde de quinta-feira, nisso já estávamos chegando perto de fevereiro, ela saiu de manhã bem cedo para comprar pão, voltou de tardezinha, disse que entrara por engano em uma livraria e o dono a colocara em uma prateleira lá no alto, só conseguiu descer depois que alguém colocou uma escada para revirar uns livros que estavam ali por perto. Depois desse dia ela nunca mais foi a mesma, não parava em casa, saia logo cedo e não dizia para onde ia, voltava com as paginas reviradas, marcas de cigarro, a capa molhada de cerveja. Comecei a suspeitar do livreiro, em uma tarde qualquer enquanto ela não voltava, fui até lá, entrei como um cliente qualquer que procura por determinado livro, o velho estava nos fundos tirando o pó de umas velharias, olhei em todos os lugares, procurei por todas as prateleiras, até conversa com ele puxei depois, e nada. Voltei para casa desolado, já tarde da noite. A minha tristeza foi ainda maior quando entrando na cozinha, acendi a luz e vi aquele recado na porta da geladeira, aquele maldito recado com letras mal escritas, “AMOR, ME PERDOE, SEI O QUE SENTE POR MIM E SINTO-ME TRISTE EM NÃO PODER CORRESPONDER TEUS SENTIMENTOS, NÃO POSSO CONTINUAR TE ENGANANDO, QUERO QUE SEJA FELIZ, MUITO. COM AMOR, BRENDA, SUA LISTA TELEFÔNICA. Mais tarde, quando subi até o quarto notei que o despertador também havia partido.

quinta-feira, 19 de julho de 2007

média piada


É engraçado.

Os transeuntes e o trânsito na mesma briga de sempre entre paredes e chão concretados e árvores asfixiadas. Seu desejo insaciável de adquirir um automóvel cada vez mais zero quilômetro pra encher de amigos e xoxotas. Muitas mulheres por aí engordam e entopem as artérias de gordura e entopem o rosto de maquiagem e se entopem de hipocrisias demais e dizem que nem ligam, pois já estão casadas. Os homens, apesar de casados, nunca desistem do carro mais novo, pois ainda não comeram a secretária, a vizinha, nem a amiguinha da filha e nem os colegas invejosos do escritório. Os filhos, inspirados em filmes e novelas de maior sucesso, seguem bebendo, fumando e cheirando o dinheiro, os bagos e os ovários dos pais, sempre se achando muito espertos, mas sem nunca aprender a dar uma boa foda, porque o cordão umbilical atrapalha. Apesar de tudo, essa classe média vive bem e feliz, pois já encontraram especialistas que isolam perfeitamente as paredes, o teto e o piso do apartamento. Juntam isolamento acústico com elevadores privativos e vidros com insul-film 100% e está ótimo, nenhum vizinho perceberá nada. E, se acaso perceber, eles também têm seus podres. Guerra fria no condomínio!

É engraçado.

Os sobrenomes, os escudos, as famílias. Sempre que vão ao show da rita lee se vangloriam intimamente por serem a única ovelha negra. Não importa se apenas deram sorte ou se fizeram por onde, estão sempre à parte por serem os únicos que fizeram e fazem, que pensaram e pensam alguma coisa diferente. Nenhum deles está incluso no grupo que todos eles formam. Falam as mesmas palavras elaboradas e exclusivas (no sentido exclusivo da palavra) não por falta de opções, mas porque dizem sempre as mesmas lorotas: moral, ética, religião, não-religião, política, emprego, salário, quanto?, carro, casa, casa de campo, apartamento no litoral, previdência privada, criei meus filhos, um advogado, uma veterinária, outro arquiteto, aposentadoria, suéter, cachorrinhos de estimação, tempo, netos, velhice com a cabeça grisalha pra fazer comercial de plano de saúde. Mas são apenas estereótipos, coitados, não é justo! Mas o que são estereótipos? Talvez não seja a percepção desta caneta que esteja a pecar. É a média que peca, mas tanto faz! Recebem sempre o perdão de um padre bem pago, moribundos na cama rodeada pela família, solidária, que já carrega nos bolsos os advogados, já maquinando como lutar pela maior fatia da herança dos bagos do velho tão logo ele deixe de teimosia e solte o último suspiro.

E não deixa de ser engraçado.

À espera de Capitú


Véspera:


"...Quis nunca te ganhar Tanto que forjei Asas nos teus pés Ondas pra levar Deixo desvendar Todos os mistérios..."

Divirta-se meu amor, mas volte logo, que eu tô te esperando com TUDO que essa VIDA precisa.

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Deixei um relatório no imeiodamhel...
Se tudo correr bem logo estarei como aquele astronauta que jogava xadrez com o computador.

Segundo dia: Meu nome é Nelson e está TUDO sobre controle.

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Eu bem que tentei.
A Bruna falou que estava estranha A Gruta. Concordei, faltava você...

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Sétimo dia:

Ando perdendo muito no tetris. Esse computador é um sexissista, não vai com a minha cara e só perde pra você.

Ah, sim... meu nome é Bentinho... E tenho dito!

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Oitavo dia:

Meu nome é Robson, Robson Crusoé...
Não existe ninguém mais só nessa ilha.

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Décimo segundo dia:

"Arrenego de quem diz
que o nosso amor se acabou
ele agora está mais firme
do que quando começou..."

Hoje encontrei Zé do Norte, ele me disse que abufelar no mato lanha tudo as costa...

Ah... meu nome é Adão e páro por aqui que aquela cabrita tá me olhando de esguelha, vou dar uma bulinada.

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Décimo quarto dia:

fiquei falando sozinho...

Meu nome é: tu tu tu tu

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Décimo sexto dia:

Encontrei um pedaço de pau na ilha, estranhamente tinha o formato da Virgem. Imediatamente me posicionei em sinal de adoração aproveitando para pedir a única coisa que poderia pedir: que apareça logo uma companhia.

Achei que, assim como quando olhamos para o alto apontando algo indefinido as pessoas em volta param e olham também, uma multidão apareceria para me acompanhar. Mas não aconteceu. Passei os últimos 16 dias ajoelhado e nada!
Olhei mais atento a santa e percebi que a madeira era oca. Ao menos serviu para a fogueira que esquentou a sopa da noite...
Ah tá! Meu nome é Gal..... Galvão

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Décimo oitavo dia:

Nada de novo no front. Apenas fantasmas virtuais, os de sempre. Cansei desse monólogo, afinal, fantasmas só existem se acreditarmos neles. Onde estará minha vida em carne e osso? O que estará fazendo com tudo?

Sempre que cruzo o deserto, me chamam Jesus... que saco!

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Vigésimo dia!

Apanhei um velho vinil do Arrigo Barnabé. Procurava algo que justificasse minha insistência em permanecer conectado a espera do amor. Diversões eletrônicas, sim. Mas foi a faixa Orgasmo Total que me redimiu...
Clara Crocodilo chegou, fato. E me devorou.

Meu nome? Diga-me você, meu amor...

terça-feira, 17 de julho de 2007

idiótes


Tentei lembrar alguma lição que eu já tivesse aprendido, alguma experiência que eu já tivesse vivido, minhas pernas tremiam sentadas na poltrona e nem ao menos algum exemplo no qual eu pudesse me apoiar. Tontura, enjôo, meu corpo fervia por dentro e minha pele suava frio. Sem palavras ou nós na garganta, close na boca e nos olhos, agradável inquietude: um simples “eu te amo”.


Senti falta das exigências da gravidade, que tanto ajudavam a ficar em pé. O mundo girava, labinritite crônica que provocavam aquelas palavras em meus ouvidos. Nunca tinha imaginado, sequer sonhado, que isso pudesse acontecer e que era assim que acontecia. Impossível suportar. Disse que não assim que pude, do jeito que pude, sem palavras.

Saí do cinema ainda no meio da sessão e a noite continuava cinza e garoando fino e frio. Um cigarro por costume e observando os casais e os não casais, felizes e tristes pelos lugares, e perguntava ao vento como podiam ser tão idiotas a ponto de acreditarem nessas idiotices.

Procurava não me molhar muito na garoa e nem ao cigarro. Buscava esquecer as escolhas erradas e passadas; tantos filmes que não valiam a pena assistir. Cinza na noite, meu coração adormeceu e teve sonhos que eram só sonhos, num sono breve.

Procurava não lembrar a garoa, a noite, nem os sonhos, que não valia à pena insistir.

Poucos acordes





Vem surto ânsia baco letargias calafrios trópicos
Acordes pobre pulos direção vicio todos finais

No centro ronda guias protegem furadas moicanos espeto
Napalm descarrego mortífero reflexo eu estranho devendo alguma pedra meninas Arkansas

Abra armário feto toltecas alisam gostam templos manchados excrementos


segunda-feira, 16 de julho de 2007

DO OUTRO LADO DA RUA.

Ontem de tardezinha ficamos no portão de casa conversando, eu e os meus amigos enquanto o sol descia e sabe o que foi melhor? Eles trouxeram cerveja e um álbum de fotografias, Brahma gelada e eu guardei um punhado lá na geladeira de casa para não esquentar, de vez em quando alguém ia lá e apanhava uma, não demorou muito e já havia acabado, afinal não era tanta cerveja assim. Fiquei olhando as fotos enquanto a gente recordava todas as estórias, a gente ria e eu quase não acreditava em tantas loucuras, planejávamos outras, mas sem muitos detalhes, porque você sabe a gente sempre fez tudo de uma maneira intensa demais e essas coisas não exigem muitos planos, simplesmente acontecem. Lembra daquela viagem que fizemos no começo do ano? Daquelas trilhas, vales e cachoeiras? Do seu relógio que eu fui buscar no fundo da água? Água gelada, também não batia sol – e você ficou rindo o tempo todo. Lembra daquela festa na sua casa, acho que foi em abril e você inventou de fazer caipirinha e acabou molhando todo o sofá? Lembra que pegamos uns panos úmidos e depois torcemos eles de volta no copo? haha – acho que inventamos uma nova bebida naquele dia. Também teve aquela noite em que fomos no comício do prefeito e enquanto ele discursava a gente dividia os fones do meu disk-man.
Ontem de tardezinha ficamos lá no portão de casa conversando, eu e os nossos amigos enquanto o sol se escondia por detrás dos telhados. Já tava quase de noite quando todos foram embora, o melhor de tudo é que me deixaram com as fotos – acho que a minha irmã não deve ter visto, fiquei sozinho junto com aquele monte de latinhas vazias olhando para o muro branco do outro lado da rua, revi as fotos e sorri para mim mesmo enquanto recordava nossas estórias, deixei o álbum em cima da mesa da cozinha junto com as latas vazias, fui até o quintal e revirei nas tranqueiras que o meu pai guardava, acabei encontrando uma lata de spray preto – brilhante, voltei até o muro dessa vez iluminado pela luz de um poste recém aceso e enquanto algumas pessoas passavam escrevi o seu nome com letras bem grandes para que fosse lido e relido por todo mundo, depois sentei em frente de casa outra vez e fiquei olhando para o muro, achei que ele estava mais bonito desse jeito, ao menos para mim, pensei também em todas as coisas que passamos juntos e refleti em como eram tolas as pessoas que acreditavam que você havia realmente ido embora...para sempre.

Para Fernando e Katiusse.

sexta-feira, 13 de julho de 2007

INFERNO OVER NIGHT

Já andava feito louco pelas ruas do Planeta Ateu repetindo as mesmas frases, carregava um megafone, às vezes parava na porta de alguma fábrica ou colégio, qualquer prédio grande, cheio de salas de escritório, cheio de pessoas, esperava a hora em que elas iam chegando ou saindo em maior número, e lá estava ele gritando com seu megafone. Era conhecido como Joãozinho-Pé-de-Barro, pois nesse planeta, Deus era um conceito muito primitivo. - Somos todos feitos apenas de barro, deixa de ser besta Joãozinho. As pessoas viviam repetindo, e ele saia feito louco, batendo o pé em disparada e soltando palavrões. Era motivo de piada onde quer que fosse, e muita gente fingia creditar-lhe certa dose de confiança apenas para fazer-lhe troça pelas costas.
No Planeta Ateu apenas à três tipos de pessoas era dado o direito de acreditar em Deus, às crianças, aos loucos e aos idiotas, Joãozinho parecia uma mistura dos três, mas não estava nem aí para o apáticos, como ele mesmo dizia.
Um dia aconteceu, sabe-se lá em qual localidade exatamente, mas o fato é que Joãozinho-Pé-de-Barro arrumou uma esposa e essa mulher passou à seguir-lhe os passos, assim também foram os filhos, sete ao todo e todos crentes na existência de Deus, a essa altura do campeonato a família de Joãozinho era conhecida e de certa forma evitada em todo o planeta, porém com o passar do tempo, os filhos de Joãozinho foram crescendo, casando, os homens foram convencendo suas esposas, as mulheres convencendo seus maridos e a população de pessoas que acreditavam em Deus foi crescendo, crescendo, até que fundaram a primeira escola somente para pessoas que acreditavam em Deus, depois veio o primeiro hospital, a primeira vila, o clube, o partido político, certa eleição, ganharam, compraram votos, construíram templos, escadas que os levariam aos céus, mudaram por decreto o nome do Planeta Ateu para Planeta de Deus. Joãozinho ficou rico, muito rico, toda a família de Joãozinho prosperou, mudaram então o sistema para monarquia, Joãozinho agora era rei, presidente, conselheiro, tudo ao mesmo tempo, seus filhos tinham os cargos mais importantes, eram lideres de comunidades, falavam para multidões.
Certo dia, uma luz muito intensa surgiu no céu, todos ficaram a postos, exceto é claro, as pessoas que não acreditavam, e aquela luz foi chegando mais perto, cada vez mais perto, Joãozinho e todos os seus seguidores postaram-se emocionados em reverências à luz divina. Até que por fim chegou bem perto, parou, todos olharam, silêncio no planetinha...............................................
era um ônibus espacial, de dentro saiu uma menina de cabelo raspado e brinco no nariz e com um megafone gritou bem alto: ESSA NOITE TEM FESTA NO INFERNO, BEBIDA POR CONTA DO DIABO. E todos aqueles que não acreditavam subiram as escadas do ônibus espacial e deixaram o antigo Planeta Ateu, convertido agora, num chato e ditatorial Planeta de Deus. E logo depois o Planeta de Deus mergulhou numa sangrenta guerra entre as pessoas que acreditavam que Deus fosse verde e as pessoas que acreditavam que Deus fosse azul. Enquanto os loucos faziam festa no planeta ao lado, apelidado temporariamente de INFERNO OVER NIGHT.

terça-feira, 10 de julho de 2007

A COMIDA CHINESA MAL ASSOMBRADA

Tudo aconteceu naquele primeiro sábado de inverno, estava em casa com o meu irmão mais novo, já havíamos sido avisados de que os nossos pais só voltariam para casa na terça-feira pela manhã, estavam participando de um simpósio, eles passavam a maior parte do tempo viajando de um lado para o outro, eram representantes numa dessas empresas que trabalham naqueles esquemas furados de pirâmides, andavam empolgados que só vendo, até parece que eles é que eram as crianças da casa.
Deixa primeiro eu contar uma coisa, o meu nome é Sâmara, tenho doze anos e o Pedro, meu irmão, tem sete e parece um idiota, o que é bem comum para garotos dessa idade. Quando nossos pais não estavam em casa nos controlando, comíamos todo o tipo de porcarias que se possa imaginar, geralmente pedíamos hambúrguer no Fast King ou milk-shake no Red Bear, eu poderia passar um ano comendo esses troços todos e garanto que não me importaria nem um pouco. Acontece que naquele sábado a unidade do Red Bear que atendia o nosso bairro estava fechada para reforma e o numero do Fast King só dava ocupado, de manhã eu tinha juntado uma porção de correspondências da caixa do correio e no meio das correspondências tinha uma em particular que me chamou muito a atenção, era em papel jornal, branco e preto, falava sobre um tal restaurante de comida chinesa, entregavam em casa e tudo, o mais estranho era a foto de um armário daqueles horríveis, antigos, no canto direito do papel. Não liguei muito para esse detalhe, estava curiosa para provar uma das tais comidas chinesas que eu tinha ouvido falar em um programa de televisão duas semanas antes. Meu irmão estava na rua, então nem me importei se ele iria querer ou não, peguei o telefone e disquei o número. Uma voz muito estranha, de uma mulher, atendeu do outro lado, parecia que fazia eco, uma voz rouca, mecânica - tinham três opções de comida, macarrão-não-sei-com-o-quê, frango xadrez e salada com uma carne de nome estranho, acabei escolhendo o frango. Cerca de 10 minutos depois alguém bateu na porta dos fundos, achei estranho, eu estava na sala esperando a comida ou esperando que o meu irmão voltasse da rua, fui até a porta dos fundos pensando que fosse algum vizinho, olhei pela vidraça, um cara de gorro, baixinho, abraçado à um pacote enorme, vestia uma espécie de saia medieval, nem olhou para mim, apenas ficou ali com aquele embrulho estendido na minha direção, apanhei o pacote e levei até a mesa, quando virei novamente com o dinheiro da comida, ele simplesmente havia desaparecido, desci os cinco degraus da escadinha de madeira, olhei para todos os lados, nada. Tentei ligar para o restaurante, mas ninguém atendia, achei que já estivesse fechado, dobrei o dinheiro e guardei, esperando que pudesse pagar pela comida outro dia. Fui até a área da frente, havia alguns moleques na rua, mas nada do meu irmão. Voltei para a cozinha, e olha só, o mais estranho de tudo, quando eu cheguei lá, as duas caixinhas de comida chinesa estavam fora do pacote, abertas como se esperando para serem devoradas. Peguei primeiro o biscoito da sorte e quebrei na palma da mão, tinha um alfinete enferrujado dentro e um bilhete escrito: caixão quebra, morte enterra, desejo vem. Quando li isso fiquei com medo, tranquei a porta dos fundos, inspecionei o banheiro e a despensa, então escutei passos nos quartos lá em cima, chamei pelo meu irmão, ninguém respondeu, os passos continuaram, até que ouvi a porta do armário do quarto dos meus pais sendo aberta, rangiam e de repente ventou muito, embora as janelas e portas estivessem fechadas. Não sou a pessoa mais corajosa do mundo, talvez se fosse de noite eu saísse correndo em direção à rua, mas talvez por ser dia, e um dia muito bonito por sinal, subi para ver o barulho, lá em cima cheirava à vela, defumador, qualquer coisa assim, a porta do armário estava fechada, girei o trinco, abriu devagar, rangendo, me afastei, as roupas estavam todas reviradas, alguns cabides quebrados, desci correndo e joguei a comida fora, quero dizer, joguei as duas caixas ainda fechadas no lixo. Levei para fora, foi quando vi o meu irmão subindo a rua, pensei em contar para ele, mas é quase certo que ele não acreditaria e o pior de tudo, ainda iria contar para os meus pais que pensariam que eu fosse maluca e todas essas estórias bobas de família.
Meus pais chegam essa noite, estou no quarto agora e o meu irmão já está dormindo, ainda guardo o bilhete que veio no biscoito da sorte chinês, às vezes tenho a impressão de que aquele baixinho anda lá fora vigiando o que acontece aqui dentro, talvez tenha se sentido ofendido por eu ter jogado fora o frango xadrez, mas sabe-se lá o que tinha dentro daquelas caixas, minhocas? Cobras? Aranhas? Escorpiões? Não sei, deve ter sido só impressão. Tentei ligar para o restaurante, mas a mulher que atendeu disse que lá funciona um escritório de advocacia e nunca ouviu falar de restaurante chinês na nossa cidade, o folheto não tinha endereço, só o telefone. Arrumei a bagunça do armário naquele mesmo dia, não encontrei nada de estranho, exceto é claro, os cabides quebrados que joguei fora. De qualquer forma, foi só um susto, vou ver se consigo dormir essa noite. Ouço batidas na porta dos fundos lá embaixo agora, deve ser algum vizinho, o idiota do meu irmão continua dormindo, depois eu conto o resto da estória, vou descer para ver quem é. Já volto.

sábado, 7 de julho de 2007

A necropsia de todas as Alices





Dezenove vitelas de mercenário
Carbonizados irão saborear o peru do dia de ação de graças em pedaços espalhados em sacos pretos de plásticos
Na roleta da resistência os premiados com a loteria de explosivos pelos poros se limpam para oração
Meca sagrada e não mais Jerusalém faz os fiéis se submeter à devoção ao misericordioso de fumaça para os peles vermelhas ?



quinta-feira, 5 de julho de 2007

Dois textos velhos.

O Sanguinolento

Ele achava uma besteira toda essa história de pistolas e munições.
Vanderson queria ser bandido, mas não gostava de armas de fogo.
Era um sonho louco. Uma coisa fora do normal.
"Bandido nunca foi profissão", dizia sua mulher.
Ele dizia que sim. Nada digna, mas se fosse por isso, políticos, padres e agiotas também deveriam ser punidos pela lei.

"Abençoadas sejam as leis", ele sempre dizia.
Gostava mesmo delas.
Respeitava todas quando não estava em serviço.

Mas, voltando ao assunto: ele não gostava de fogo.
Gostava mesmo era de facas.
Pontudas e afiadas. Preparava com carinho a faca de cada dia.
Amava todas de sua coleção.
Gostava do sangue escorrendo pelo fio de corte.
Quando respingava em sua roupa e encharcava suas mãos de sangue ia ao êxtase.
Sempre calmo. Sempre frio.
Vanderson queria ser bandido.
Morreu como açougueiro.


***

E você, quer o quê?

Queria dormir mais e acordou.
Ia ficar deitado na cama, mas levantou.
Não quis tomar café, mas estava sem açucar.
Dessa vez ia de carro, mas a greve dos ônibus o atrasou.
Ia pedir as contas logo de manhã, mas trabalhou.
Pediu à tarde, mas isso não é nada relevante num escritório de contabilidade.
Iria se demitir ao fim do dia, mas fez as contas e viu que não podia.
Na volta quis ir de metrô, mas os ônibus engarrafados sem aumento de salário o incomodaram mais uma vez.
Quando chegou em casa pensou em fugir.
Pena que já estava em casa.
Ia aproveitar pra comer salada: emagrecer.
E queria depois uma imensa sobremesa: prazer.
Comeu apenas um pacote de macarrão instantâneo e tomou uma com limão porque não tinha vinho.
Queria dormir cedo, mas tinha jogo na televisão.
Queria assistir tudo, mas adormeceu no intervalo.
Quando acordou com o filme da madrugada quis morrer, mas só dormiu.
Em seus sonhos ele quis tudo e conseguiu.
E logo acordou do pesadelo.
Queria esquecer de tudo, mas pensou na vida.
Queria desistir de tudo...
...desistiu!

A MORTE DE MARK CHAPMAN

Aquele dia foi um dia como outro qualquer. Quero dizer, com exceção do barulho todo que as pessoas faziam nas ruas, pouco antes da contagem regressiva na Times Square, as coisas pareciam absolutamente normais, a neve que acumulara-se na janela em nada diferia da neve que caíra no ano anterior, o ronco de Starsbolk, meu companheiro de turno, era o mesmo, incessante e terrível, até a musica que tocava no rádio continuava sendo a porcaria de sempre, aquele blá blá blá interminável de um raper qualquer metido a besta.
Acontece que, embora toda aquela agitação que precedia a virada do ano, toda aquela balburdia ao ritmo de temas natalinos e pacifistas, havia um ruído que me incomodava sobremaneira naquela noite. Vinha lá dos lados do corredor norte, onde as coisas normalmente eram um pouco mais silenciosas. Chequei as câmeras internas e nada encontrei de anormal, exceto é claro, pelos longos dedos de Kinsey fora da cela, Kinsey fora um bandidinho de aluguel nos tempos de mocidade, vangloriara-se de seus feitos passados, matou dois caras certa vez, em meados de 1970, até que foi pego, dirigindo bêbado à caminho de Chicago. Agora, entretanto, não passava de um velho com seus dedos enrugados, fitando o chão cinza da penitenciária. Voltei os olhos para Starsbolk, continuava dormindo, o ronco parecia ter diminuído um pouco, remexeu o corpo na cadeira, dizendo coisas ininteligíveis e tombou a cabeça como se sonhasse com alguma coisa agradável o bastante para que eu o acordasse. Fui até a máquina de café, aquele ruído parecia ainda maior, nem cheguei a tocar no copo, voltei para as câmeras, tudo normal do lado norte, leste, oeste, sul. Até que meus olhos deram para aquele quartinho, um minúsculo quartinho no final do corredor norte, era onde os faxineiros guardavam panos, baldes, vassouras, todas essas coisas. Tentei a comunicação pelo rádio, mas Altaman, o faxineiro, não respondia, provavelmente estivesse metido no almoxarifado, bêbado, escutando a algazarra que vinha das ruas. Como era véspera de ano novo e nessas épocas, por mais firme que um sujeito seja, é preciso reconhecer que somos invadidos por inexplicáveis sentimentos humanitários, resolvi não incomodar Altman, tampouco Starsbolk. Olhei novamente para a câmera que captava a porta do quarto-despensa, apanhei as chaves e me dirigi até lá. Nem é preciso dizer que à medida em que eu avançava, mais estridente se tornava aquele ruído, até que foi tomando forma, a forma de um zumbido muito alto e irritante, girei a maçaneta, abri a porta, o ruído continuava, dessa vez ainda mais alto, acendi a luz, olhei para todos os lados, nada encontrando, revirei aqueles baldes e panos todos, cogitei a possibilidade de estar enlouquecendo depois de tantos anos trabalhando com todo o tipo de maluco que se possa imaginar, revirei as vassouras, os rodos, o zumbido continuava, cada vez mais alto, até que por fim encontrei-o, perto do rodapé, atrás do encerador, mexia as anteninhas e parecia me encarar, peguei o inseticida e joguei uma vez, nada, continuava no mesmo lugar, zumbindo e me encarando, joguei outros dois jatos, tombou no segundo, ficou lá, esperneando e zumbindo, aquelas perninhas todas agitadas, não me encarava mais, parecia desesperado. Fiquei um tempo olhando, até que o barulho e a agitação das pernas e das antenas foi diminuindo, diminuindo. Então silenciou. Pisei em cima para ter certeza de que não voltaria a fazer barulho quando eu saísse. Uma gosma verde espirrou pelo chão. Era pequeno. Não maior do que um mosquito desses comuns. Voltei para a minha sala, Starsbolk que acordara a pouco, veio com dois copos de café. Fez o serviço? Ele perguntou. Fiz. Respondi. Vamos pedir umas pizzas, afinal é noite de ano novo. Chamamos Altman pelo rádio, nada. Deixa ele pra lá. Comentei. Os ponteiros na Times Square marcaram meia noite de 31 de dezembro de 2007. Ouvimos os fogos. Depois de um tempo tudo voltou ao normal. Inclusive a porcaria da musica que tocava no rádio.

domingo, 1 de julho de 2007

Amplidão

Um continho de amor, porque assim como os discos precisam de canções de amor, os livros precisam de algumas dessas tais histórias. E, se um dia calhar de só haver a literatura na minha vida - vai saber -, fica mais fácil pagar as contas assim... eh eh eh! Bom, vamos ao conto, que é baseado numa música do grupo norueguês Jaga Jazzist, Oslo Skyline.


Amplidão

Ampla.

A paisagem que se vê pela janela do ônibus. Esta que nos leva a outros lugares, outros tempos. Uma viagem dentro da viagem que fazemos.

É mais agradável assim, quando percebemos o todo da natureza ao redor da estrada - de mãos dadas. Realmente estamos juntos. E não me culpo por querer que seja sempre assim.

Ternura...

Mas quem saberia, de verdade?

O horizonte, distante, mas disponível ao toque do olhar, mostra uma história que não se revela. Não o futuro imediato. Não o final da história, em que um de nós cede e cada qual segue um caminho diverso. Pela morte ou pela vida.

Preferiria simplesmente deixar de pensar nisto e simplesmente me ver homem em seus olhos, não importando o que antes chamei de verdade ou o que um dia eu possa vir a chamar, que se sinta mulher em meus braços enquanto trilhamos o caminho conhecido de tantos e inédito a nós.

O momento. Algo que não se explica.

Transbordamos.

Mesclamos-nos em nossa jornada. Com os céus e as montanhas. Mesmo os arranha-céus da cidade onde deveremos chegar estão plenos de nós e do que espalhamos. Enxergo além da janela do ônibus. Você é a minha paisagem. Ampla.


campo de concentração


vejam senhores senadores
o que pensa o povo brasileiro