quinta-feira, 2 de agosto de 2007



Ele gosta das pretas.
Por mais que me contradiga, que brinque com as brancas também, eu sei que ele gosta das pretas.
As brancas sempre começam, e a iniciativa intimida.
Eu? Contento-me em ser dama branca, em minha casa branca ao lado de um rei que sequer me procura, além do mais, é a batalha que me consome.
- Vai, meu peão, avança! Dê-me passagem que essa luta depende de mim. Desculpe, eu não sei seu nome, é que vocês são muitos e são tão parecidos. Broncos e lerdos, mas audazes. Capazes de dar a vida por um rei que não merece, por uma dama que nem sabe seu nome...
- É a guerra, súdito meu, alguém precisa morrer! Recebe esse fado, que ao chegar no outro reino, tem minha palavra, será quem quiser.
Mal profiro cristãs palavras de consolo, e um bispo vem me atacar. Meu Rei? Ele nem se importa, dança um roque com a torre, vai lá pro cantinho e se esquece de mim.
Destemida que sou, devasto o clero oponente, e o meu também. Se eu vencer essa peleja, farei um reino laico.

...

Eu queria mesmo...
O que eu queria mesmo era ser comida por um cavalo. Aquele que vem como se valsasse, num L de loucura, de luxúria, de libido.
Submersa no prazer, esqueço que minha vida é um jogo, não vale nada.

...

Não valeu! Ele me desconcentra, e acaba por me vencer.
Meu rei encurralado clama por meu nome. Eu, ressentida, pronuncio ao inimigo, àquele que joga com as pretas.
- Guarde o cheque, cavalheiro! Tome as jóias da coroa e mate aquele que há tempos morre em seu trono...
Chegada a hora de guardar as peças, convido afavelmente pra um duelo mais tarde.
E venço. Sem armas e bem longe do tabuleiro.