quinta-feira, 27 de março de 2008

Momentum (in extremis, in fieri).


Parte II - Da conscência de um karma

Ele foi abrindo os olhos devagar. Dessa vez não tinha luz nenhuma. Estava num lugar pequeno, escuro, aconchegante e assustador. Não lembrava de nada, era como se nunca tivesse existido. Olhou em sua volta e viu apenas alguns resíduos de luz que pareciam entrar sorrateiramente pelas frestas que existiam em dois cantos daquele pequeno lugar. Parecia estar dentro de uma caixa. Abaixou a cabeça e fechou os olhos, tentando raciocinar. Quando fez isso sua cabeça foi bombardeada por flashes de lembranças que lhe fizeram tomar ciência do que estava acontecendo. De um instante para o outro ele teve uma incrível certeza de que passara toda a sua existência dentro daquela caixa. Teve certeza de que tudo aquilo que via em forma de lembrança não passava de ilusão. Pensava assim, pois se deu conta de que a sensação que sentia fortemente naquele instante esteve acompanhando-o desde o passado mais antigo do qual conseguia se lembrar. E era tudo muito esclarecedor. Pensando um pouco mais, ele entendeu que sempre soube o que era realmente, só não conseguia acreditar. Era torturante aceitar sua condição, por isso esquecia. Mas, logo que fazia isso, iniciava-se uma incessante batalha em busca de alguma recordação do que significava sua existência, em busca da verdade angustiante. Esquecer doía mais do que lembrar. Lembrar doía mais do que esquecer. Era um círculo frustrante, sempre. Mas ele estava brevemente satisfeito por lembrar-se de tudo. Ele entendeu que não passava de um simples "Momento". Sua existência consistia em nascer, abrir os olhos, ficar confuso dentro de uma prisão escura até criar consciência da razão pela qual existia, fazer sua parte nos planos da existência universal, angustiar-se e morrer para, depois de um ciclo do Universo, nascer novamente sob as mesmas condições. Ele era apenas um componente inconsciente do Tempo e do Destino e ajudava-os, involuntariamente, a formar e manter o passado, o presente e o futuro de tudo.

Quando estava preparado percebeu que tinha mãos e que aquela caixa tinha portas. Neste momento sentiu medo e uma vontade inexplicável de contrariar-se à vontade do Tempo e do Destino. Quis destruir toda uma eterna história já feita, contada e recontada. Quis a liberdade e surpreendeu-se por saber que era o único a desejá-la entre seus iguais. Surpreendeu-se mais ainda e frustou-se ao descobrir que sua rebelia já estava planejada desde sempre e que ele mesmo já tinha vivido isso infinitas vezes.

Agora sim, estava realmente preparado. E faria a sua parte na história do Universo num corpo de um homem. Seria uma experiência realizada pelo Tempo e Destino, que consistia em dar vida e livre arbítrio a um "Momento".


Continua...

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