terça-feira, 2 de outubro de 2007

O VENDEDOR BONZINHO

Era uma vez um vendedor de sapatos listrados que nunca conseguia vender nada. O problema nem era tanto o produto que ele vendia, ainda que fossem ridículos, existiam em número suficiente pessoas interessadas em compra-los. O problema era que o tal homem, o vendedor de sapatos, tomado de pena pelas coisas que via e dessa maneira tornando sua a miséria alheia, não conseguia mentir. E se esse fosse o único entrave entre ele e as pessoas que visitava, talvez até conseguisse vender um par aqui, outro acolá. O fato é que deixar de inventar estórias para o produto dessa forma contando somente a verdade sobre o material que era empregado na confecção dos sapatos, o processo de fabricação e a sua resistência, parecia não ser o bastante para o vendedor. Ele muitas vezes, comovido com a situação precária em que se encontravam, certas pessoas que visitava, saia a torto e direito distribuindo pares de sapatos para aquela gente pobre e mal alimentada, distribuía sapatos para todos, para os velhos, os jovens, homens, mulheres e crianças, principalmente para as crianças. Gostava muito delas, e chegava a sentir certo embaraço quando vendo a alegria que iluminava aqueles rostinhos imundos, não tinha um punhado de balas para distribuir com elas. E assim era a vida do vendedor, saia cedo de casa todos os dias e voltava tarde da noite, sem um único centavo no bolso e a imensa mala outrora cheia de pares de sapatos listrados, trazia agora, embaixo do braço, vazia. A esposa entendia o coração do marido e talvez por isso nada comentava sobre suas vendas fracassadas, deixava o prato de sopa na mesa, coberto com um pano, e quando ele chegava, era em sonhos que ela estava perdida. Então o vendedor bonzinho tomava devagar, gole por gole, sua sopa de galinha, tirava a roupa de trabalho, vestia o pijama e recostava-se ao lado da esposa que dormia, e todas as noites remexendo os bolsos vazios procurando um bilhete esquecido ou o cartão de certo alguém que nunca encontrara, cruzava os braços atrás da cabeça e fitava o teto na escuridão do quarto, com um sorriso incontido estampado no rosto já meio envelhecido e cansado.

Um comentário:

Mhel disse...

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