sexta-feira, 29 de junho de 2007

LENDAS DE FAMÍLIA.

Toda família tem suas histórias. Muitas delas preenchidas de altas doses de exagero e fantasia. O fato é que esses casos correm à boca pequena, e todos, sem exceção alguma, não hesitam na hora de afirmarem suas participações como testemunhas oculares do fato, ainda que tenham nascido, anos ou até mesmo décadas depois do ocorrido.
Tem uma história que permeia minha família, desde que eu me entendo por gente. Não sei se é verdade ou mentira. Sei que foi confirmada por muitos, pode parecer loucura, mas quem é que iria inventar um troço maluco desses? Pois a história é a seguinte, ah, antes de tudo, vou lhes apresentar o pessoal, o elenco. hahaha.
Rita era a minha vó por parte de mãe, a mais nova das irmãs de uma família de quatro filhos, Tereza, Francisca, Luiz e Rita. Antigamente o calendário do mês de junho era marcado, sobretudo por festas, bailes e comemorações. Os meus bisavôs tinham se mudado, fazia pouco tempo, para uma cidadezinha no interior de São Paulo, perto de Bauru, nessa tal cidadezinha os bailes de São João eram muito comuns e logo a Tereza, irmã mais velha da minha vó, animou-se a participar. Não sei bem qual o motivo, porém, lá pelas tantas, um dia qualquer, já entrando no dito mês, o meu bisavô acabou que proibiu terminantemente a filha de participar das festividades. Essa, por sua vez, se trancou no quarto, batendo a porta com estrondo e colocou-se a berrar lá de dentro que iria no baile nem que fosse acompanhada do diabo. Passou um tempo até que a menina por fim se acalmou, deram a discussão por encerrada, e durante duas semanas ninguém tocou mais no assunto. Porem na ultima semana do mês, certo cair de tarde alguém batera na porta dos Andrade, Luiz que ainda era bem moleque nessa época abriu a porta e deu de cara com um distinto cavalheiro que perguntava por Tereza, sua irmã. O sujeito fora convidado a entrar enquanto minha bisavô passava o café, postou-se a conversar com o meu bisavô, de maneiras nobres, o gentil desconhecido logo cativou o velho, passado algum tempo deixou a casa acompanhado de Tereza, cujo consentimento dos pais, dirigia-se para o baile que a essas já estava a toda. Nesse dia, Tereza demorou-se a voltar, chegou em casa por volta das 10 da noite, o que para uma menina de 15 anos, naquela época, era um abuso e tanto para a paciência do meu bisavô, que já não era muita, deve-se dizer. O que contam, e isso na minha família e coisa que ninguém nega, é que a partir desse dia Tereza nunca mais foi a mesma pessoa, tornara-se calada, arredia, muitas vezes agressiva, ficava horas e horas sozinha, geralmente no quarto, nunca mais voltou a tocar as mãos numa bíblia, passava longe da igrejinha da cidade e nem mesmo de bailes ou festas voltou a participar. O cavalheiro que a acompanhara até o baile nunca mais foi visto. Contava um outro primo que certa feita, passando bem em frente a um desses salões onde as pessoas dançavam até o raiar do dia, olhou pela fechadura da porta e viu lá dentro no exato momento em que o seu relógio marcara meia-noite, a imagem de dezenas de diabinhos dançando, todos de ponta cabeça. E disse ainda, e isso é coisa que me lembro embora fosse ainda criança – Era sabido por toda a cidade que naquela noite a sua tia Tereza havia dançado nos braços do Satanás - Fez o sinal da cruz. Minha mãe logo mudou de assunto. Eu era criança e aquela foi a primeira de tantas outras vezes que ouvi a mesma história, cuja conclusão sempre fora, da minha parte, a mesma.
Vai saber.

quinta-feira, 28 de junho de 2007

A minha música

Esta é a história de um amigo. Ele existe. A mãe, esquecida, não o buscava na escola. Ele ficava ali no portão, sozinho. Quase ninguém prestando atenção à sua solidão, até que...


A Minha Música

Ei, quem é você? Porque me olha com essa cara de dó? Nunca viu um cara triste sentado na calçada? O que você quer saber de mim? Quer saber quem eu sou, né?

Pois eu digo.


Sou o que sou, o que fui e serei.

É que eu choro, ontem criança, na porta da escola. Hoje eles me esquecerão outra vez.
- O que foi, menino?
- Mamãe... ela não v-veio me buscar...
Bom que eu aprendo sozinho o caminho. Mas carinho, amparo, proteção... nada disso é demais quando se é pequeno.

Uma vez eu me olhei no espelho e me vi grande, 20 anos, com minha sombra cantando aquela música. E olhando de novo, com 20 anos, enxergando o garoto de seis no espelho, verei que você me abandonava, me esquecia mais uma vez. Só que você já será outra pessoa.

Eu sou o que sou, o que fui e serei. Tudo ao mesmo tempo. Porque não muda. Porque carregarei comigo a dor que não pude negar.

E vivi marcado por isso.


Mas eu marquei o caminho de volta. Não precisarei mais do amparo dos que deviam me amar, na verdade, tão ausentes. Sou gente grande e posso mudar tudo. E se no fim nada der certo,
ao menos o menino continuou a ter sua música.

Então eu também o vejo, fazendo o velho caminho da escola para a casa. São outros tempos - ele canta a música, baixinho, para si mesmo (é, o personagem recorrente!)...

Curta


Quase um ano e me lembrei.
Tem esse lance aqui: http://curtascurtas.blogspot.com/
Se alguém quiser, eu compartilho.

quarta-feira, 27 de junho de 2007

Abissais


Seres abissais.

Feios, para os padrões vigentes.

Maravilhosamente lindos e interessantes pra pessoas como nós, não acha?

Um sem alma.


Noites vão, dias vêm, aparentemente sem nenhum jogo de palavras nem mudanças no script. Nenhuma troca justa. As horas se repetem uma após as outras e eu abro os olhos pela manhã trinta segundos antes do despertador cumprir o seu dever, quase inútil. O cigarro e a cerveja continuam matando, sem descanso, enquanto leio as reprises das notícias das folhas de jornal. Meus passos seguem os rastros formados nos dias e vidas anteriores, um círculo vertiginoso que enoja minha úlcera logo cedo.

Já descansei das torturas da incompreensão. Há tempos que nenhuma inquietude atreve-se. Quero que busquem, qualquer dia, um ponto qualquer de meu sacro caminho e encontrem um corpo ativo preso numa alma inanimada. Nas cavidades onde antes fitavam meus olhos, encontrem o vazio. Gritem seus piores horrores e descarreguem o peso das conseqüências de suas escolhas sobre meus ombros. Depois engulam seco meu descontraído desdém.

Espero que não sejam tão bobos. Torço pra que não aceitem a armadilha que minha carne proporá. Sorrisos que estão para sangrar, mordem antes de morrer.

A PESSOA QUE FALTAVA.

Passou a vida inteira procurando a pessoa que faltava. Sempre fora assim, desde os tempos de moleque, enquanto os outros brincavam, ele olhava com inexplicável nostalgia para os muros do fundo do colégio e em pensamentos, perdia-se dos outros. Das brincadeiras. Pequenas bobagens. Afastava-se por completo, naquela busca que era só sua. Sua e de mais ninguém. Ou será que havia outro alguém? Era isso o que estava procurando. E sua vida era como se tivesse um furo. Um cômodo vazio. A ausência de algo que sempre estivera ali, antes que ele chegasse.
Procurava pela pessoa que faltava. Essa que não estava mais. E ele não sabia ao certo se já estivera um dia. Procurava. Ia de casa em casa, e nada. Filas das casas lotéricas e do supermercado, parques, avenidas, cinemas, bancas de jornal. Certa vez pensou ter-la encontrado num ônibus a caminho de Minas, ledo engano. Era uma cigana querendo ler-lhe a mão, contar-lhe acerca de certos segredos que estavam à espreita, na próxima esquina da vida. Vacilou um pouco entre a decisão de pagar ou não pagar as cinco moedas que lhe custariam a tal consulta. Até que acabou desistindo. Não acreditava muito nessas coisas. Vai ver é tapeação, titubeou. Outra vez pensou ter-la encontrado numa roda gigante, ele tava lá embaixo, aguardando, na fila. Ela lá em cima. Sorrindo. Então desceu. Subiu novamente. Ele ficou olhando. O cabelo. O sorriso. Olhando e imaginando. Sonhando. E quando a roda gigante tornou a descer pela segunda vez, ninguém. Nada. Teria sido uma miragem? Um sonho? Estaria ficando louco? Que fosse. Continuou procurando. De cidade em cidade. Colocou anúncios em jornais de pequena circulação (não tinha dinheiro suficiente para os maiores). Andou a pé. Errante. De lá pra cá. De cá pra lá.
Chegou ao fim da vida. E tudo o que encontrou foram dores, rugas e cansaço. Esteve bem perto de perder a esperança. Mas isso, nunca. Era mais forte que ele. Precisava encontrar a pessoa que faltava. Questão de vida ou morte. Até que, certa tarde de quinta-feira tombou morto, mortinho da silva, como veio me contar tempos depois, uma sobrinha. Parentes e vizinhos logo se apresentaram para as devidas reverências, condolências e todas essas coisas. Nada mais importava.
E quando o caixão baixara na medida exata dos sete palmos. Irrompeu-lhe de repente uma forte comichão, debateu-se, contorceu-se, até que por fim despertou e olhando-se refletido naquele mogno encerado, novinho em folha. Encontrou-se nos dois olhos que arregalados, assustados, procuravam ainda compreender. Embora já soubesse, não havia nada para ser compreendido. Finalmente havia encontrado a pessoa que faltava.

terça-feira, 26 de junho de 2007

É que eu achei...


...achei que seria parecido com alguma outra vida.

#


Num piano, difusas semibreves, as notas desciam correndo as escadas. Um plano: desculpas discretas e enrugadas projetadas onde os olhos quisessem olhar. No olhar o que se via era um vazio sem fim. Buracos negros, infinitos, e castanhos por fora. Bruxas, nem milagres, nem peões de xadrez faziam mais sentido. Enquanto a melodia acelerava-se de outro andar, lenta, o corpo enrijecia-se o mais que podia. Cegava-se, a língua, na textura soturna dos ares sem música. As paredes pulsavam cor, ação tão normal de fiéis confidentes tão ingênuas. Os comprimidos faziam efeito.

foi num simples bocejar da vida
que tomou-se de quantas substâncias
os pensamentos desta criatura

matéria, nem bebidas ou fumaças
freguesia de bom crédito
faziam diferenças também

As palavras, num incompreensivo, morriam da garganta ao céu da boca. Talvez fossem alegrias, desculpas ou arrependimentos. Na verdade, esforço vão. Ingênuas e tão inúteis confidentes, as paredes que pulsavam cor não poderiam escutar.

foi num simples piscar de olhos
a vida
que tomou-se de quantas substâncias
os pensamentos
desta criatura

Os comprimidos faziam efeito. Os segredos imortalizavam-se, esculpidos no ar. As palavras, não se sabe se de alegrias ou arrependimentos, fugiam escala abaixo, entupindo a garganta.


O caminho estava certo, os comprimidos descansaram. O corpo finalmente tocou o chão. Um baque seco escapa um grito engasgado e solitário. Os pensamentos molham o chão. O teto manchado canta tenor um boa noite, no momento exato em que morre aquela curiosidade do último suspiro. As notas musicais tocam, enfim, os ouvidos inertes, sorridentes e indiferentes.

segunda-feira, 25 de junho de 2007

Pogo


Ralando no pogo perfeito
Nada de ossos intactos
Ralando no pogo perfeito
A voadora legal!!!!!!!!!!!
Esmagou minhas mãos
Orgasmos múltiplos nas dentadas da donzela punk
Ralando no pogo perfeito
Nuca e ouvidos sangram hardcore


foto gentilmente cedida por marco antonio,o mais beat dos prophanos



NO REFRIGERADOR...

Em 1979 eu tinha 17 para 18 anos e arrumei uma namorada, a primeira de uma série de estórias escabrosas que até hoje me acompanham. Às vezes eu ia até a casa dela, que ficava a umas cinco ou seis quadras de onde eu morava, mas como os pais dela não iam muito com a minha cara horrível, ela deu um jeito de vir morar comigo. No começo tava tudo bem entre a gente, até que começaram as brigas, e era uma atrás da outra, brigávamos pelos motivos mais estúpidos possíveis. Até aquela noite de abril, sexta-feira, véspera do meu aniversário. Eu tava na sala assistindo alguma porcaria na tv ou socando uma punheta, grande merda, eu tava na minha, como se diz, e ela veio lá da cozinha cheia de dedos, aqueles dedos nojentos, todos cheios de gordura de frango ao molho, começou a gritar feito uma puta esquizofrênica, e ainda tentou me cortar com um caco de vidro, fui mais rápido do que a espertinha e apanhei um machado na despensa, encontrei-a na cozinha, me esperando com uma faca na mão, mas nem deu tempo de gritar, num golpe só, abri uma tala enorme na fronte e ela tombou ao lado da pia, pedaços de massa encefálica escorriam até o queixo, tentei estancar aquilo com uma toalha, mas não deu certo, só piorou. Então eu peguei o machado, e piquei-a em pedacinhos pequenos, enrolei cada um deles em papel celofane, tirei todas aquelas tranqueiras do nosso congelador e coloquei-a lá dentro. Com exceção da cabeça que enrolei em papel alumínio, quebrei toda com um martelo e enterrei no fundo do quintal. Fígados e intestinos foi a comida do cachorro nos dois dias seguintes, tive que temperar com a gordura do frango ao molho, mas até que não foi tão difícil quanto eu imaginava. Aos poucos fui limpando a geladeira, quero dizer, eu tirava um ou dois pedaços, dependendo do tamanho e batia no liquidificador, até que o osso se separasse da carne, então eu pegava aquele pedaço de osso, triturava e jogava pela descarga, segui fazendo isso por duas semanas talvez, até que os pais dela vieram procura-la, obvio que eu disse não saber de nada, na manhã seguinte enterrei os pedaços que ainda faltavam triturar junto com a cabeça, no quintal dos fundos e me mandei para bem longe. Arranjei um emprego, aluguei uma casa e outras mulheres surgiram na minha vida, devo dizer também que comprei um refrigerador maior, muito maior do que aquele que eu tinha em Tucson, e liquidificadores melhores também. Quer dar uma olhada? Sinta-se à vontade, tem cerveja gelada no refrigerador, vá lá buscar duas para a gente e depois eu conto outras estórias minhas, gatinha.

sábado, 23 de junho de 2007

Talvez e certeza


Talvez e Certeza

Noutro tempo, o primeiro... a casualidade de ter estado no lugar onde aquelas pessoas estiveram... elas buscando respostas, ele as carregando na mochila - ainda que não fossem as respostas definitivas. Ou eram o erro absoluto?

Não sabe muito bem o porquê. No sofá da sala onde existe o aniversário da amiga, um universo de pensamentos o atordoa, junto àquelas amáveis pessoas tão mais cheias de vitalidade que ele - afinal, há o violão, a música e a vontade de comemorar. Gosta de estar, mas o ritmo é outro.

Interno. Canta baixinho, repetindo a canção e oferecendo-a aos próprios ouvidos, no exercício de re-buscar-se ali, refletindo na letra da música, puro cristal.

O exercício é também tentativa de eliminar a interrogação do texto que o martela na mente a cada dia. Começar a envelhecer não é do jeito que pensava. Percebe o risco. Um começo de fim por adaptar-se às regras do jogo? O que importa menos, quando se sabe que é possível sabotar o regulamento. Se seguir o caminho certo, está bom. Mas... quão bom pode estar? E que caminho, afinal?

Por isso, anda com os mais jovens e de espírito contestador. Os que ainda não são massa sem reação e reacionária. Os que estão nos coletivos, como quaisquer outros, mas que não exibem a face sem expressão, como a maioria. Os que não têm as respostas, mas que têm em seus olhares o brilho do puro cristal. "Então, que busquemos juntos", pensa. Assim, não lhe parece que o mundo possa ir tão mal.

Talvez a busca não esteja sendo feita da forma correta - e ele já não é mais tão jovem para erros. Ou talvez seja um vampiro involuntário da juventude alheia, sugando sem se dar conta a energia de quem está ao redor.

Seja qual for o talvez que se tornará certeza, se é que haverá a certeza, ele gosta de estar ali, com aquelas pessoas, os ditos amigos. São poucos, mas bons.

Texto com base em:

terça-feira, 19 de junho de 2007

A IMENSA BOLSA DE BRUNA VEIGA

Era uma vez uma menina. Era uma vez uma menina porque é assim que começam as estórias nos livros. Continuando, era uma vez uma menina que carregava uma imensa bolsa de pano.

Em que tempo se passa esse conto?
- não é conto. É fato.
- Tudo bem, é fato. Em que tempo se passa esse fato?
- Pra quê quer saber?
- Pra preencher sua estória.
- Se passa em 1943.
- Tão antiga assim?
- Antiga e atual.
- Então continua......

Era uma vez uma menina que carregava uma imensa bolsa de pano. O seu nome era Bruna Veiga e todas as pessoas do planeta em que ela vivia (planeta estilo Pequeno Príncipe, mas não tão pequeno) a conheciam como A Menina da Bolsa Gigante, e a bolsa era mesmo gigante, diziam que reis e rainhas ali se escondiam, castelos inteiros eram carregados para cima e para baixo, dragões, princesas adormecidas, príncipes encantados, sapos, bruxas, duendes......

Em que lugar se passa esse conto?
- já falei que não é conto. É FATO.
- Tudo bem......desculpa. Em que lugar se passa esse fato?
- Ah, sei lá. No tal planetinha sem nome.
- E não vai inventar um nome para o seu planeta?
- Não.
- Nenhum?
- Porra. Vai me deixar continuar a estória ou não vai?
- Sem palavrões.
- Foda-se.
- SEM PALAVRÕES.
- FODA-SE.

Onde eu tinha parado mesmo? Ah sim, então.....certo dia Bruna Veiga estava na fila do banco e todas as pessoas estavam esperando a horas para serem atendidas e a menina do caixa era meio surda e meio cega e meio paranóica e tinha que ficar toda hora indo para o banheiro tomar uns remédios que ela injetava direto no pescoço e tal....e aí Bruna, a-menina-heróica-dos-contos-não contados-porque-na-verdade-são-fatos tirou de dentro da sua imensa bolsa gigante milhares, milhares não, centenas de cadeiras de balanço que rangiam e todas as pessoas da fila sentaram nas cadeiras e começaram a balançar e aquele barulho ensurdecedor de todas aquelas cadeiras que rangiam deixaram o gerente louco a ponto de derramar sangue pelos ouvidos, menos a menina do caixa, que era meio surda, e Bruna Veiga ainda tirou de dentro da sua imensa bolsa de pano, fones de ouvido que tocavam música e distribuiu para todas as pessoas da fila e todas as pessoas ficaram felizes e foram atendidas e só o gerente morreu nesse dia, mas Bruna logo tirou outros dois gerentes novinhos em folha de dentro da sua bolsa e colocou no lugar do antigo e esses gerentes eram do tipo que emprestavam todo o dinheiro do mundo e todas as pessoas ficaram ricas, pois os novos gerentes doavam todo o dinheiro também e o banco faliu e fechou e ninguém nunca mais precisou de banco. Só banco de praça. E todos foram felizes para sempre.
.FIM. SIM.

Trafégo e Revolta


“E o verbo se fez carne e habitou entre nós”
mas carne? Onde reina a penúria?
o verbo se fez pele e osso
o verbo era a fome
a fome habitou entre nós
ocupou as metrópoles, os discursos hipócritas
e ganhou as ruas!
Refletida no meu retrovisor
desfila soberana entre os carros
fede, como fede a miséria
e como fede essa gente!
Acelero, acelero em vão, sinal fechado
meus olhos fechados
poupam meu peito, meu dia
desta realidade que não me pertence
A realidade, tal e qual a escuridão
Enche-nos de assombro no primeiro instante
Perturba, repugna, mas logo que a vista se acostuma
O que antes revoltava torna-se paisagem.
“Bem-aventurados os que tem fome!”
Palavras de um homem que morreu tendo sede
E esse maldito sinal que não abre
A fome emporcalha meu pára-brisa
com água, sabão, com lágrimas
intima pelo vidro seu preço
inútil contestar, a fome tem pressa
e esse rodo é uma arma
– Acabaram-se os miolos, afastem-se mortos vivos!
– Deixe-me com minhas lástimas que também não são poucas!
Sem argumentos, piso fundo e atropelo a escória
e com ela, a omissão de um povo.
Animais matam pelo seu alimento, é uma lei natural
e há tempos não estou no topo da cadeia alimentar
A morte mandou lembranças!
Covarde! Mandou crianças
que não ouvem o ronco dos carros
porque o de suas barrigas soa mais alto
barrigas colossais, tal e qual as grávidas
como quem empanturrou-se no almoço
antes fosse e não seria fome
mas são apenas vermes...
pobres vermes sem esperança
cujo sangue ainda escorre entre as rodas do meu carro.

segunda-feira, 18 de junho de 2007

Cosmos diminuiu ( para maiakovski)




Companheiros vamos se jogar no esterco , desta vez com fé
A vanguarda redige um manifesto ?????
Destilados e toda Rússia que ser consolado
Porcos burocratas
Ceifadas poéticas
A gangorra dos milênios em Outubro
Deslize sentimentos na rota da Sibéria
Mais o cosmos diminuiu !!!!!
Fiquem alerta companheiros será nosso destino o mausoléu ou o bronze de nossos bustos na praça vermelha????

domingo, 17 de junho de 2007

NOVE MILHÕES DE DIAS CHUVOSOS.

Sentada na frente do computador quebrado
unhas partidas, pintadas de vermelho-sangue
dedos que denunciavam o império da velhice
impregnando-lhe os braços, o pescoço, a boca
cabelos tingidos de neve e olhos perdidos de Lorax
digitando, tentando - como se catasse milho
e o computador desligado.
(TECLA TECLA TECLA)
enquanto o sangue escorria
(TECLA TECLA TECLA)
enquanto a noite descia
(TECLA TECLA TECLA)
e a sua alma era fria
olhou para a tela negra, apagada, quebrada
sentiu suas dores expostas, viu suas flores mortas - chorou.
Olhando pela janela viu o pássaro acenando
lá do alto daquela nuvem estranha
ou seria uma montanha?
lembrou-se de quando era bela
lembrou-se de quando era ela
e parada esperando ainda
tentou acender um cigarro
tentou engolir o catarro
daquele império feito de barro
e lá se foi outro gole
e se seguiu outro porre
pois lá estavam estampados também os seus vícios:
uma unha quebrada, pintada de vermelho-sangue
e a solidão sufocante - essa, a pior de todas
daquelas que matavam aos poucos,
enquanto o tempo escorria,
escorria,
e
s
c
o
r
r
i
a........daquela unha quebrada.

(ao som de Nine Million Rainy Days - Jesus and Mary Chain)

sábado, 16 de junho de 2007

Blowin' In The Wind (bob dylan)





Quantas estradas precisará um homem andar
Antes que possam chamá-lo de um homem?
Sim e quantos mares precisará uma
pomba branca sobrevoar
Antes que ela possa dormir na areia?
Sim e quantas vezes precisará
balas de canhão voar
Até serem para sempre abandonadas?
A resposta meu amigo está soprando no vento
A resposta está soprando no vento

Quantos anos pode existir uma montanha
Antes que ela seja lavada pelo mar?
Sim e quantos anos podem algumas pessoas existir
Até que sejam permitidas a serem livres?
Sim e quantas vezes pode um homem virar sua cabeça
E fingir que ele simplesmente não vê?
A resposta meu amigo está soprando no vento
A resposta está soprando no vento

Quantas vezes precisará um homem olhar para cima
Até poder ver o céu?
Sim e quantos ouvidos precisará um homem ter
Até que ele possa ouvir o povo chorar?
Sim e quantas mortes custará até que ele saiba
Que gente demais já morreu?
A resposta meu amigo está soprando no vento
A resposta está soprando no vento

Cássia blues


Santos familiares depositaram minha sorte
Cantarolei nos meses chuvosos do delta
Não consta mais em minha certidão de nascimento nossa terra.
No piso que tem farelos de algum cereal que amarela minhas unhas desgastadas pelo blues
Nas paradas, fiscais surram meus patrícios do sul.
Mama são quebrados pelos murros e chutes
Espectro das fazendas de algodão?
Estão sendo uma diversão racista no navio negreiro que é América?
Lamento do sul na sensibilidade do aço que caracteriza o norte?
Agridoce as chaminés desse ninho apelidado de seguro
Cordão umbilical amarrado nas sementes da próxima colheita
Jornada dedilhada de feno com inspiração
No moquifo, gaitas, cigarrilhas, tremedeira pela cafeína.

FINAL PERFEITO.

Desejo que todas as pessoas que criam pássaros em gaiolas
Despertem do sonho, tetraplégicas - por uma semana ou dez dias ou mais
E desejo também que pássaros livres venham cantar na janela de cada uma delas
Todas as manhãs - este sim será o final perfeito do filme.

quinta-feira, 14 de junho de 2007

Resguardo (opera rock)





Resguardo (opera rock)

Daqui acolá
Sabemos de cor é soterrado
Pode perecer peripécia soletrada
Bob, saca o passivo da barbie ?
Divinamente paspalho

Mirante de Santana
Libra de sangria mensal
Catatau, profissional da alfândega, curitibano arretado

Mimosa mecânica preparou o pé na nádegas
Cílios gigantescos e de origem duvidosa escafedesse
Ilusionista fixo no lance de trucagem por absoluta vontade

quarta-feira, 13 de junho de 2007

Atrasado?

Feliz dia dos namorados!!!

terça-feira, 12 de junho de 2007

A música, outro ritmo

Depois de pensar em Oração ao Tempo, do Caetano. Depois de pensar em Dalí, enquanto o tempo se desfazia...


A Música, Outro Ritmo

Saudade do tempo em que o tempo não precisava ser conquistado. Simplesmente estava lá, para nós.

Era uma quimera...

É que sempre há o momento em que ele se rebela - ou será a vida? Sim, a vida é que se torna outra e fazemos qualquer coisa com o tempo, sem percebermos. E ele vai embora, sem percebermos.
O tempo que volta. O tempo dos apaixonados, dos que querem mudar o mundo.
Houve um tempo, Miriam, em que o poeta escrevia pra você, mas jamais mostrava. Você não pode se lembrar, porque só agora eu lhe digo.

Quando percebe, você se assusta. Vejo agora em sua fisionomia. Vi anos atrás, também. Você me faz querer rezar. Mas é justamente o que não faço. Posso, no máximo, desejar sem esforço que o tempo se torne novamente seu aliado. Apenas isto, porque, de qualquer forma, o tempo me mata. E é melhor o desejo sem esforço porque qualquer esforço é inglório.

É, com o passar dos anos... eu comecei a duvidar de sua relação com o tempo. E a dúvida cresceu até virar certeza do fracasso. Esta é a verdade.

Eu nem sei porque falo. Tudo continua como antes: ouvíamos a mesma música, mas não marcávamos o mesmo ritmo, com os pés.

O poeta, meu bem, aquele poeta que escreveu pra você... está morto. Eu o matei anos atrás, mas você não soube de nada. Matei-o da forma mais óbvia, sabendo que você não poderia saber. Fiquei ao seu lado, e isto você sabe bem.
O tempo que trai. O tempo do último leito... haverá a chance de dizer adeus?
Não podemos caminhar juntos agora, por causa de nossos ritmos, que são outros para cada um. Não somos capazes de dobrar o deus inflexível e caprichoso aos olhos de quem não entende. Mas ele... ele, sim, nos junta ou nos afasta. E mudar isto, ah... mudar isto...

Como, se não conseguimos entender a nós mesmos?




Corisco febril após morder a maçã vermelha de Dadá


Eita eita eita
Como queima essa maleita!
Que eu tô vermelho!
Que eu tô ardendo!
Nem vem dizer o que já sei
Cá tô eu: despedaçado e mulambento!

Eita eita eita
Como queima essa maleita!
Ranquei os pentelho!
E por aí vai vendo
Que bola vazia é norma e lei
Cá tô eu: matei tudo os meu rebento!

Eita eita eita
Chega cá que é coisa feita!
Mel e laço fedelho
Que eu tô escorrendo!
Vó diz: é fêmea pra ma´de mês
Catô eu, com a força de quatro vento!

Dia dos Namorados! (eu não ia deixar passar)


Foi no tempo em que os animais falavam.
Mulheres prometidas ao filho do fazendeiro
Regresso da Universidade
Necessitado de uma donzela prendada que lustre suas botas.
Foi no tempo de nossas saias e calçolas.
Tempo de nossa virgindade.
Nem com muito esforço será possível imaginar.
Virgens! Ai seu deus, virgens!

Ganhamos o direito ao voto e de escolher o infeliz.
Encurtamos a saia e criamos o vibrador.
Lésbicas!
Bissexuais, trissexuais, pam!
Fuck me, my tree!

E quando a brisa passou
Sentimos falta dos ombros largos...

O homem era um mal necessário
Visto que os vidros de azeitona ainda resistem à nossa força.
Visto que os móveis ainda pesam, e a torneira, às vezes, pinga.
Chamamos e dissemos:

Nunca será meu amo, mas eu te amo!
Pague uma bebida e venha pros meus braços, cachorrão!

E a mulher inventou o namoro e viu que era bom (gênesis 1, 31)
E o dia dos namorados brasileiro
(que não é no mesmo dia do americano para não influenciar a cotação do dólar)
Além de um dia de fila no motel
É também um dia de Luta!

Queimemos nossos sutiãs, porém matemos nossa sede de amor!

E como diria a mulher de Vinicius..."que não seja imortal, posto que enjoa...mas que seja duro enquanto dure..."

até o adestrador de lesma

ou será o adestrador de lemas


rsrsrs


tb quer postar um poeminha de amor


parece que ele parou em alguma taverna medieval é bebeu vinho local!!!


e escreveu....



Trigo do leste


A espada, que feri os inimigos da coroa, ecoa em Castela.

Tua terra, bela amiga es purificada pela alma dos súditos do rei Artur.

Dos guardiões de sua majestade do norte, devo lhe dizer amiga, sou trigo do leste!

Tua ternura adormeceu nos ombros de outro senhor?
Minha espada, não tem sede das batalhas que lutei, contras mouros e bárbaros, por ti amiga, serei servo de deus e será esse o caminho desse desvario cavaleiro?

Talvez a ordem dos franciscanos, a mais próxima da pureza entre os gentis?

Amiga!Amiga! De um nome pagão e submeta esse corpo tão antigo e cansado como a Europa, seu!
E por falar em Dias dos Namorados - mais uma data criada para o consumo de cada dia deixo aqui a pequena poesia declaração de amor ao poeta e homem que compartilha a minha vida (Rafael Mafra)

em:

Todos os dias especiais
Deita no meu colo e adormece como criança


Deita no meu peito e com um beijo na testa despede-se

Dorme ao meu lado todo encolhido - Ou -
Dorme tão junto a mim que já não sabemos que perna, pés, braços nos pertence!

Sorri na manhã de mau humor iluminando o meu dia!

E faço o mesmo para que nossos dias sejam todos especiais

E mesmo quando o silencio invade

.....
....
...

o assunto desaparece

...


e o silencio prevalece

...

mesmo assim

....

os dias são sempre diferentes
mesmo sendo iguais

e especiais...

muito

...

mais que especiais!

Alessandra Queiroz

(pari hein!! agora preparem-se)

DIA DOS NAMORADOS.

Depois de anos e anos de televisão (os seriados eram a minha droga preferida) desconfio que ainda resta alguma coisa do meu cérebro. Não sou tão burro a ponto de ser feliz e além do mais eu comemoro essa coisinha estúpida chamada DIA DOS NAMORADOS, ao contrário dos vermelhos-comunistas-malditos, vide nosso camarada Nelson, que futuramente, se tudo der certo, será convencido à juntar-se na Trincheira do Verdadeiro Valor Cristão, eu ainda carrego dentro de mim essa chama apaixonada, esse impeto amoroso perfeito que me faz percorrer corredores de shoppings e mais shoppings procurando pelo presente ideal para a minha menininha. A minha menininha....alguns aqui já devem conhecer a Bruna, ela carrega uma bolsa enorme, parece uma sacola gigante, quase arrasta aquele troço pelo chão, e lá de dentro, tira de tudo, mas isso é outra estória, o que eu gostaria de contar é que esses dias, sábado mais especificamente, falei com ela sobre o grande dia de hoje....amorzinho. eu disse. a gente bem que poderia dar um pulo naquele fast-food, ou num restaurante típico qualquer, sei lá, um vinhozinho importado, naquele barzinho onde a bossa rola, (mamãe quero ser pequeno burguês) que que cê acha benzinho? então ela olhou para mim e deu aquela risada engraçada de sempre, uma risada contida, não tem como reproduzir aqui, mas é mais ou menos assim, sabe quando você tá fumando um beck e alguém conta alguma coisa engraçada bem na hora em que você tá segurando? é isso....daí ela não se pronunciou mais, creio que não goste dessas festividades, tampouco de mãos dadas pelos corredores dos shoppings ou galerias. imagina só aquelas vitrines todas refletindo os nossos olhos apaixonados. apaixonados no dia dos namorados.
só os burros são felizes.
não é difícil imaginar.

JAM

Meus olhos percorrem teu rosto,
pes
coço,
des
li
zo
.
.
.
eEmmm ssseeggGGrReeeedDDDo00 - te cubro de desejos
.
(esboço um Sorriso)
.
[peça]
[por]
[peça].....te desnudo.

(em silêncio............................IMPROVISO.............................

segunda-feira, 11 de junho de 2007

Escreve-me ...

Florbela Espanca


Escreve-me ...


Escreve-me! Ainda que seja só
Uma palavra, uma palavra apenas,
Suave como o teu nome e casta
Como um perfume casto d'açucenas!


Escreve-me!Há tanto,há tanto tempo
Que te não vejo, amor!Meu coração
Morreu já,e no mundo aos pobres mortos
Ninguém nega uma frase d'oração!


"Amo-te!"Cinco letras pequeninas,
Folhas leves e tenras de boninas,
Um poema d'amor e felicidade!


Não queres mandar-me esta palavra apenas?
Olha, manda então...brandas...serenas...
Cinco pétalas roxas de saudade...


comprime melancolia



continuado estava estava outra vez como estava

desgovernado estava estava ( nocauteando )
estava meu estava
estava tava (coexistido)v/a
(um memorando do ilustre chá da tarde tomado e apreciado na porta do reino da cidadezinha das calçadas bolchevista)


Isto sou eu.
E. como podem ver, estou sem tempo.
Textos existem.
Mas estou sem tempo.
Fecharam a net no trampo.
De vez em quando eu passo aqui, lemas!
Abraços!

sábado, 9 de junho de 2007

Saliva disco (2)




Silencie os andaimes do prédio






Um coro de retardados entra na anti-camera de esfriar gado






Fios descampados na vagina tira o resto da consciência






Almejo entrar em alguma gangue e bater em minha mãe até o traumatismo craniano ser




anunciado no alto-falante do hospital






Pai ,uma arma branca em seu peito ,parabéns!






Venham ajudem arregaçar minha querida irmã

Saliva disco (1)


sssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssss




Silencie os andaimes do prédioUm coro de retardados entra na anti-camera de esfriar gadoFios descampados na vagina tira o resto da consciência Almejo entrar em alguma gangue e bater em minha mãe até o traumatismo craniano ser anunciado no alto-falante do hospitalPai ,uma arma branca em seu peito ,parabéns!Venham ajudem arregaçar minha querida irmã


sssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssss

sexta-feira, 8 de junho de 2007

Infanticídio pub

Um barraco alagado com mobília de varias épocas

Marasmo total - bombardearam Berlim! Bombardeara Berlim

Seco encardido (assustado) o que?

Marasmo total (com uma risada histérica). De camisinhas!

Seco encardido - lendo as pichações dos banheiros da estação; lembrei da Alice vomitada!-

seco encardido retira do bolso uma xícara e grita...Ela deve ter seios fartos como a CIA nos porões

Dando aula para os pervertidos sexuais que usam táticas de guerrilha nas chicanas- nesse momento o radio anuncia que o ministério da saúde recomenda o homem impróprio para o consumo!!

Castro mirabolante

Rasgo a impaciência que me presenteou
Todas as largatas assadas em fogo brando no céu de sua boca são pragmáticas
Tenha cortes ardidos simulando o perdão que ficou encenado em frente dos espelhinhos mestiços das feiras infernais
Barbantes desfiados são a certeza do tolo se pajeando na varanda
Dentes em potrificação rezam suas cartilhas no momento de lucidez
Transformo o pesadelo de ser quintal chiqueiro em coerente zoológico

O Pós–Fim ou The end de plástico


Ela se foi enxugando as lágrimas. A incerteza em sua bagagem não era mais que um peso extra que nos últimos meses se acostumara a carregar. Uma vez ou outra, tentara se livrar como quem coloca o lixo na rua em dia e hora marcados, mas sempre perdia o momento.

Neste fim de semana não fora diferente, mais uma vez tentou descarregar a incerteza que pesava sobre seus ombros. Ele a amaria o bastante? A desejaria mais que às outras? Existiriam outras? Essas são as questões que se colocavam teimosamente a qualquer momento. Durante uma transa, diante da TV, vasculhando a Internet (quanta tecnologia fácil!), não obtinha as respostas desejadas e a noite anterior fora perfurada por sua voraz inquisição como extensão natural dos jogos de salão que insistiam em jogar, ainda que fossem enfadonhos. Truco, dominó, pife-pafe, Ela ganhou todas as disputas, mas não estivera contente, pois seu jogo mais quente não obtivera o resultado desejado: desestabilizar o interlocutor, quebrar suas convicções, desmascará-lo, desfigurá-lo, enquadrá-lo.

Ele há tempos dizia ter deixado de acreditar nos padrões estéticos vendidos com margarina nos comerciais da TV (Será de plasma? Tão pequena!). O amor, a família, a vida eram conceitos e valores para serem sempre reinventados, pois assim como eram apresentados e deglutidos, tinham gosto de sabão em pó. Por isso qualquer resposta que cogitasse dar às inquietações dela, em particular nos momentos de pressão, não eram mentiras e também não traziam a áurea da verdade.

Ele sabia que as relações humanas se baseiam em palavras e essas podem assumir significados distintos. Essa informação fundamental colhera durante a adolescência lendo filósofos que não entendia muito bem, mas que deixaram fragmentos de idéias em sua memória, as quais usava como podia. Assim, amar para uns pode querer dizer cerveja e para outros, tempero industrializado. Qual seria o significado da palavra amor para Ele? Como tornar visível e palpável? Ela entenderia da mesma forma que Ele? Deveria usar o sorriso/máscara da pasta de dentes para deixar as coisas claras?

Ela interrompe sua vida amorosa com suas dúvidas como os intervalos comerciais cortam filmes românticos na TV (queria uma dessas em cada lugar! hummm). Cada vez mais um novo intervalo, por tempo indeterminado, suspende o fluxo da história de amor. Fosse uma novela essas interrupções não provocariam tanta angustia, pois sempre existirão as cenas dos próximos capítulos. Mas que um filme tem que ter um fim. Teria esse um final feliz?

A cada parada para balaço da história dos dois Ele se contorcia, com a repetição desse ritual começara a desconfiar que os “comerciais” faziam parte do filme como em “Os ladrões de Sabonetes”. Acostumado a pensar que podia inventar sua vida de forma independente, livre dos padrões vigentes, sabia que sua criatividade estava em cheque. Ele necessitava criar, Ela o inspirava, mas não reconhecia sua obra, esta simplesmente não exprimia o que necessitavam: ouvir palavras sintéticas e ver cenas em replay.

O filme recomeça e eles são os únicos espectadores. Ela está de volta e é já o epílogo história, momento tradicional herdado da antiga tragédia grega. O coro diante das fatalidades do enredo proclama sua última lição moralizante para a doutrinação de quem assiste. Ambos torcem para que o final não seja trágico. Ambos querem um final feliz? Qual?

Ela deseja saber o quanto e como é amada a todo o momento, expressão dada apenas por uma palavra, ou um gesto copiado do filme, ou os dois.

Ele deseja continuar acreditando que pode inventar novas formas de expressar seus sentimentos. Vaidoso, buscava algo de autêntico para si (esse filme já passou?).

A tensão vai ao máximo, os espectadores sofrem a catarse. Fim da exibição. E serão felizes para sempre, ainda que estejam proibidos de saber o que acontece depois do THE END. A sessão da tarde tem seus limites, isto é certo. Ele e Ela terão de tomar de assalto o direito de inventarem novas cenas, as quais serão certamente censuradas - a insistência é obscena.

Reclames tentam vender seus produtos: a família feliz oferece a paz analgésica; o casal moderno oferece a vodka orgásmica; grupos felizes e inteligentes revelam a verdade absoluta da revista semanal...

(O mais puro amor, ai, ai!)

(Ora, ora! A felicidade é para todos, não é?!)

ELE e ELA têm o seu quinhão enquanto transam no banco de traz, do carro último tipo, estacionado no saguão do shopping. No pós–fim se ocupam em testar o conforto dos bancos de couro. Assim poderão saber se vale à pena concorrer à promoção do dias dos namorados.

terça-feira, 5 de junho de 2007

SOLO DE BONGÔ.....

Terça-feira, cinco e quarenta da manhã..... bêbado de vinho subiu no telhado e começou a batucar debaixo da chuva. Sandra saiu à janela com uma toalha enrolada na cabeça. Nove graus positivos e todos os dedos amortecidos. Na lentidão do inverno, a cidade despertava.
TAM TAM TUM TAM TAM TUM TAM TAM TUM TAM TAM TUM

Lá embaixo nas ruas, carros passavam com pára-brisas agitados espirrando água de chuva nos boêmios encolhidos de frio e preguiça. Enquanto as frutas eram ajeitadas nas prateleiras da mercearia, onde os ratos faziam festa roendo os fundos de um saco de milho. Algumas luzes se apagavam, outras se acendiam.
TAM TAM TUM TAM TAM TUM TAM TAM TUM TAM TAM TUM

Numa ruazinha não muito longe, lá atrás, Luiz saía de casa com uma mala preta, dessas pesadas, enquanto Sandra sem pressa passava o café esperando pelo leiteiro. Despediram-se com um beijo e o portão ficara semi-aberto, como se também à espera da furtiva visita, enquanto a chuva apertava cada vez mais.
TAM TAM TUM TAM TAM TUM TAM TAM TUM TAM TAM TUM

Fios de telefone e energia elétrica, antenas de televisão, out-doors espalhados, pinturas nas paredes molhadas..... um gato passou pelo muro que dividia dois prédios, olhou para o tocador de bongô e foi embora revirar os lixos outra vez, de trás do restaurante. Dois mil despertadores espalhados, tocando ao mesmo tempo.
TAM TAM TUM TAM TAM TUM TAM TAM TUM TAM TAM TUM

Um homem segurando um cigarro parou e olhou em volta antes de atravessar a avenida depois de ter saído de um bar bem em frente à estação principal do metrô, um outro lia as notícias de uma revista de esporte na banca de jornal tendo o cuidado necessário para que o vento não levasse embora o seu chapéu.
TAM TAM TUM TAM TAM TUM TAM TAM TUM TAM TAM TUM

Duas mulheres vestidas com peles sintéticas lamentavam-se da falta de sorte e das taxas de manutenção das galerias subterrâneas para onde eram levadas toda a comida e as mentiras da cidade. Laura atirou a toalha ao pé da cama, fechou as persianas enquanto Luiz subia as escadas com barulhentos passos apressados.
TAM TAM TUM TAM TAM TUM TAM TAM TUM TAM TAM TUM

O leiteiro enfim apareceu, o café estava servido na mesa, ao lado de uma revista de esporte enquanto Marta assinava um cheque em branco na parede ao lado. Na saída de um bar, dois negros com saxofones discutiam, enquanto um outro deixou cair uma nota de cinco e duas outras de dez perto do balcão. Dezenas de moedas cairam no chão.
TAM TAM TUM TAM TAM TUM TAM TAM TUM TAM TAM TUM

Lúcio saiu correndo quando o vento arrastou o seu chapéu para o meio da avenida, um ônibus parou quando duas estudantes acenaram..... Laura e Luiz se amavam, Sandra e o leiteiro também, Marta entregou uma folha de cheques e pegou de volta os vinte e cinco em dinheiro. Nada de novo no front, a cidade enfim despertara.
TAM TAM TUM TAM TAM TUM TAM TAM TUM TAM TAM TUM

segunda-feira, 4 de junho de 2007

A vida que começa

Breve história que Sargento Pimenta já contou, versão 2007.


Primeiro dia de 2007. Acordo quando todos acabam de ir para a cama. “Indisposição”, disse, sem pensar na desfeita a parentes e amigos. Algum comprimido e não me dei conta dos fogos, a não ser por aqueles do mundo dos sonhos que poderia percorrer.

Tenho a chave do carro sobre a escrivaninha e a mochila arrumada em silêncio no dia anterior. Uma música quarentona toca em minha mente. Sempre dizem que devemos começar um ano de forma diferente. Então pensei: “desta vez, vai.”

Antes de sair do quarto os músculos param. Esforço além do humano, mas sigo. Levanto sorrateira e confirmo: ninguém acordado. Melhor, pois olhar para o rosto de mamãe me faria desistir. Bilhete passando pelo vão da porta. O que sonham esses dois que deixo?

Saio e o sol do primeiro dia da vida é lindo. Sorrio.

E vou.

Música aqui:


sexta-feira, 1 de junho de 2007

JIMI JOHNSON FOI PRA GUERRA

Jimi Johnson empunhou sua metralhadora automática e mergulhou na selva tropical africana, o pequeno e miserável país encontrava-se atolado na mais sangrenta carnificina dos últimos decênios. Desde a posse do Ministro Imperial Zazi Baba, a tribo dos Zulabanas vinha promovendo incessantes ataques às forças de segurança do governo e ameaçavam invadir a Zona das Trincheiras (paraíso das plantações de Papoula), lugar conhecido pelo grande numero de minas terrestres ativadas, cujos moradores (muitos deles) pulavam numa única perna pelas ruas de terra de Akpur, recebendo auxilio das Tropas Aliadas Moderadas.
Jimi acendeu um cigarro como se fosse cinema e seus companheiros fizeram o mesmo. Imensos mosquitos carnívoros ficavam à espreita de algum pedaço de braço nu para que fosse devorado (em questão de segundos) – a fumaça dos cigarros ajudava a mantê-los afastados.
A situação tornara-se caótica de fato quando a parte territorial delimitada e destinada à tribo dos Abuganis, da qual o Ministro Imperial fazia parte, foi anexada ao Estado Maior (responsável por 90% da produção de petróleo e por 75% da extração de carvão do país). Os Zulabanas acusavam o governo fascista de Zazi Baba de favorecer os Abuganis, e esses últimos estavam armados até os dentes, pois eram cristãos apoiados pelo Grande Ocidente. Evidente que Jimi e seus amiguinhos ignoravam tudo isso, eles estavam apenas a fim de inaugurar seus brinquedinhos sangrentos e salvar sabe-se-lá-o-quê.

PRONUNCIAMENTO POLITICÓIDE PARA TRANQUILIZAR AS PESSOAS E / OU AUMENTAR O ÍNDICE DE APROVAÇÃO DO PRESIDENTE:

- Temos ótimas noticias para a nossa imensa massa trabalhadora e dedicada que nos últimos anos tanto têm cooperado para que o Governo converta grande parte do dinheiro arrecadado com os impostos que os senhores pagam em melhorias significativas para toda nossa sociedade. É com imensa alegria que lhes informo: os magníficos esforços dos nossos heróicos soldados (em especial àqueles que infelizmente pagaram com o preço da própria vida por tão valoroso beneficio à geração presente - e todas as gerações futuras) têm resultado em consideráveis vitórias para a liberdade da África Centro-Sul. Cerca de 20 pequenos vilarejos já foram reconquistados pelas nossas forças só nos últimos quatro dias e em todos esses lugares a população local pôde retomar suas atividades normais. Portanto senhores, peço a colaboração de todos vocês, sabemos que nesse momento faz-se necessária compreensão de todos. Devo tranqüiliza-los a respeito das obras nos hospitais e escolas, que em virtude da terrível e inesperada guerra africana foram deixadas de lado, assim que a situação estiver sob controle em pelo menos 80% do território atualmente ocupado pelos terroristas Zulabanas, faremos uma nova licitação com empresas interessadas em dar continuidade à construção dessas obras tão importantes para o desenvolvimento pleno da nossa nação. Muito obrigado pela atenção de todos, que Deus esteja conosco e lembrem-se de que cada um de vocês é responsável pela nossa inevitável vitória nessa guerra contra o fascismo gratuito dos inimigos da democracia.

DE VOLTA PARA A SELVA

Jimi e todos os outros soldados da tropa apagaram os cigarros, não era conveniente, àquela altura, serem identificados pelo inimigo na escuridão da selva que agora adentravam. E eram cerca de quarenta homens pisando no chão lodoso e desconhecido, cada vez mais fundo, cada vez mais longe, adentrando, adentrando, adentrando.....até que fossem enfim, engolidos pela selva africana.

Continua.

lá pelos lados do Azerbaijão ou da Libéria ou da Coréia ou.........enquanto houver água.